As células imortais de Henrietta Lacks
Em setembro de 1951, uma mulher chamada Henrietta Lacks estava morrendo. Há alguns meses, a americana de 30 anos havia sido diagnosticada com um câncer que a minava por dentro.
Internada no único hospital do estado que atendia negros. O câncer de Henriettta se espalhara rápido demais. O tratamento não surtia efeito. Pasmos, os médicos não entendiam como os tumores haviam tomado vários de seus órgãos em tão pouco tempo.
No dia 4 de outubro, Henrietta morreu aos gritos provocados por uma dor lancinante. Mas não completamente, um pedaço dela sobreviveu - está vivo até hoje e revolucionou a ciência do século 20.
Descendente de escravos e filha de agricultores de tabaco. Passou boa parte da infância nas plantações de fumo. Pobre, morava no sul dos EUA, durante o período de segregação racial. Casou-se com seu amor de adolescência, o mesmo que lhe contagiou com sífilis contraída dos seus muitos casos extraconjugais. Henrietta teve 5 filhos.
No começo de 1951, ela começou a sentir umas pontadas estranhas na barriga e ter sangramentos ao urinar, mas recusava a fazer tratamentos. Só aceitou ir ao hospital para ser examinada, quando já não mais suportava as dores.
No colo do útero de Henrietta, foi encontrado um tumor do tamanho de uma moeda, com uma coloração arroxeada e um brilho estranho. O médico retirou uma amostra do tumor para analisá-lo.
No mesmo hospital, funcionava o laboratório do médico fisiologista George Gey. A obsessão de Gey era encontrar células que sobrevivessem fora do corpo humano e pudessem ser cultivadas em laboratório. O que tornou-se possível quando um pedaço do tumor foi doado para o laboratório (sem o consentimento de Henrietta).
Gey colocou a amostra na mistura e o inesperado aconteceu: as células começaram a se multiplicar. As primeiras células humanas a se multiplicarem em laboratório. Poucas semanas depois da descoberta, George Gey foi a um programa de televisão exibir as células imortais. "Aqui está uma criação de células cancerígenas. É com elas que vamos encontrar um fim para o câncer".
Rapidamente, o tumor de Henrietta se tornou o fetiche da comunidade científica de todo o mundo. Logo começaram a ser usadas de todas as formas, em quase todos os campos da medicina: vacinas, quimioterapia, clonagem, mapeamento de genes, fertilização in vitro, longevidade humana, DSTs, pesquisas sobre o câncer, digestão de lactose, mal de Parkinson, para desenvolver remédios contra o diabetes, a vacina contra a poliomielite etc. etc.
As células HeLa foram parar até mesmo no espaço sideral. Para estudar efeitos que as radiações cósmicas teriam sobre o corpo humano, um lote de HeLa foi colocado em um satélite e enviado ao espaço.
Mas havia uma leva muito mais perigosa de estudos sendo feitos - injetavam culturas de HeLa em cobaias humanas - pacientes de câncer e esperavam as células espalharem-se. Células imortais também foram injetadas em prisioneiros: assassinos e ladrões que deveriam "pagar" sua dívida com a sociedade sacrificando-se pela medicina. O que dizem é que quase todas as cobaias sobreviveram.
Varias outras trapalhadas dos cientistas abalaram a credibilidade das pesquisas com a HeLa que estavam tão "férteis" que começaram a contaminar as outras linhagens de células que estavam sendo desenvolvidas. Bastava uma seringa mal lavada ou um jaleco usado para a contaminação acontecer.
As células imortais ainda são usadas nas pesquisas atuais. Cada lote de células pode custar entre US$ 10 e US$ 10 mil. O tumor de Henrietta virou um negócio farmacêutico multi-bilionário. Incrivelmente, nem um centavo desse lucro foi parar para os filhos de Henrietta.
Durante quase 30 anos, eles sequer souberam que um pedaço de sua mãe estava vivo e sendo usado para pesquisas médicas. A família dela, que carrega boa parte do DNA da célula mais estudada, dissecada, observada do mundo e que tanto ajudou a ciência acabou na miséria.
Henrietta Lacks - mulher negra e pobre. Desconhecida em seu país e no mundo até o lançamento do livro “The Immortal Life of Henrietta Lacks”, da jornalista Rebecca Skloot.
A dona das especiais células HeLa, que não sofrem danos quando se multiplicam e não param de aumentar de número até hoje, nunca soube que os médicos do hospital Johns Hopkins, um dos mais importantes dos EUA, haviam retirado as células que terminaria por matá-la. E que mudariam a história da ciência para sempre. Contribuiriam com avanços científicos em todo o mundo. Que virariam imortais.
Via | super.
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Comentários
otima materia
mais acho uma pura injustiça com a familia dessa mulher
Ótima história, eu também desconhecia esse fato. Pobre mulher que involuntariamente doou a vida para salvar tantas outras, e enriquecer mais outras.
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