A pobreza pode determinar a capacidade cognitiva de uma pessoa?
O cérebro humano não aparece de uma vez no panorama fetal, senão que suas estruturas se incorporam pouco a pouco umas a outras em um processo que começa no ventre e continua até a primeira parte da idade adulta. Mas tivemos que aguardar até os anos 90 do século passado para que começassem a pesquisar os efeitos de certas drogas e comportamentos sociais (como a violência intra-familiar ou o abuso sexual) no desenvolvimento do córtex cerebral.
Uma pesquisa de Pat Levitt, neurologista pediátrico do Hospital Infantil de Los Angeles, passou 20 anos estudando condições de crescimento fetal extremo, como uso de crack e pobreza em zonas urbanas marginalizadas. Foi um dos especialistas que entrou em polêmicas ao dizer que na realidade os bebês são mais fortes do que se pensava, pois podem atravessar o período de gravidez sem graves consequências apesar dos hábitos da mãe.
Esta fronteira onde nossa sociedade discute a paternidade em termos morais deve ser abordada melhor em termos científicos para conhecer o impacto real dos comportamentos sociais no desenvolvimento dos bebês, para poder assim nos propor uma arrepiante pergunta: a pobreza pode ser considerada uma forma de violência pré-natal e causa de baixo rendimento acadêmico posterior? A pobreza, pois, pode ser transmitida geneticamente?
Alguns estudos parecem apontar nesta direção. A pobreza pode ser definida, em termos de seu impacto pré-natal, em amontoamento, ruído em excesso, instabilidade imobiliária, separação dos pais, exposição à violência, problemas familiares e formas extremas de estresse, incluindo a fome, abuso de substâncias psicoativas e alcoolismo. Estes comportamentos produzem cortisona, um hormônio que pode ser transmitido de uma mulher estressada a seu bebê até a placenta. Ao crescer, a cortisona do bebê pode continuar sabotando seu desenvolvimento.
Um estudo realizado em mais de mil crianças tomou em conta diferentes fases de seu desenvolvimento neuronal e os correlacionou com fatores como o nível de rendimento da família e sua preparação acadêmica. As crianças realizaram diferentes provas de leitura e memória, ao mesmo tempo que eram recolhidas amostras de DNA para descartar a incidência de problemas de desenvolvimento adquiridos geneticamente. A inesperada conclusão foi que as crianças de famílias melhor educadas e melhor alimentadas gozavam de quase 10% de superfície cerebral a mais e um hipocampo mais volumoso (melhor memória) que as crianças com um passado de violência em um estrato econômico desfavorável.
O estudo também apontou que o nível de rendimentos em si não pode "comprar inteligência", mas que a carência dos meios básicos para assegurar um bom desenvolvimento no feto por causa da pobreza sim pode ser determinante na capacidade cerebral futura das crianças. Em outras palavras, a pobreza deixa marcas no desenvolvimento das crianças que não podem ser revertidos, pois competem a fases muito precoces do desenvolvimento, aos próprios alicerces de suas mentes. Pesquisas como esta buscarão criminalizar a violência contra a mãe durante a gravidez, mas também podem servir de base para leis mais severas contra o abuso de substâncias proibidas durante a gestação.
Via | New Yorker.
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