Congruência: o segredo de ser feliz
Quando eu estava nas profundezas mais obscuras da depressão, me encantava a chuva. Quanto mais cinza, lúgubre e triste estava o tempo, melhor. Meus amigos ficavam meio desconcertados com esta preferência meteorológica. Mas a explicação era bem simples: este era o único momento em que um fator externo coincidia com meu estado interior.
Durante essa viagem de alguns anos através de meu próprio inferno particular, quando fazia um tempo ruim, eu me sentia aliviado. Se o céu estava nublado -igual eu por dentro-, me dava tranquilidade. Não tinha que fingir. Por fim podia suspirar. Era uma bênção, um indulto bem-vindo pelo fato de sentir-me alinhado por um dia ou dois com o tempo, pese que não fosse na mesma direção de felicidade e alegria que a maioria das pessoas prefere sentir.
Felizmente, um dia, superei a depressão. Não obstante, em algum período entre a reflexão e a análise do que passara, voltei a esse ponto, ao sentimento intenso de alívio e liberação quando o exterior coincide com minhas entranhas.
Foi quando dei-me conta desta verdade: segue sendo verdade. Sempre é verdade. De fato, que o exterior encaixe com seu interior é a chave da felicidade. Sério. Exceto se seus sentimentos não se alinham com o tempo, senão com suas ações, comportamentos e estilo de vida.
Este alinhamento ou coincidência é um conceito reconhecido que os psicólogos chamam de congruência, e refere-se ao impulso humano a viver de acordo com quem somos e quem queremos ser. A infelicidade e o estresse acontecem quando há tensão e desacordo entre quem pensamos que somos (ou queremos ser) e como nos mostramos ao mundo em realidade.
A maioria de nós conhece bem esta sensação. É o que sentimos quando estamos desesperados, por exemplo, para perder peso, mas passamos a noite acarraçados no sofá comendo todas e quaisquer porcarias encontradas na geladeira.
Isto ocorre quando sua família é sua maior prioridade e, ainda assim, deixa de lhe dar a atenção necessária. É quando seu interior sabe perfeitamente que você deveria ser escritor, cantor ou mochileiro, mas nunca começa a escrever, cantar ou sair para viajar porque, simplesmente, não sobra tempo.
Esta falta de congruência pode ser apresentada até nos momentos mais insignificantes de nosso cotidiano, criando uma tensão da qual nem sequer somos conscientes, mas que se acumula em nosso estresse. Assim como quando chegamos em casa e vamos jogando tudo pelo chão, arrancando a roupa e ficando pelados para aliviar o peso da tensão, ainda que valorizemos a organização e a ordem. Ou quando revisamos os SMSs no meio do jantar, mesmo que atrapalhe a refeição. Ou quando deitamos na boca da madrugada depois de ver capítulos acumulados da série favorita, ainda que saibamos que é preciso dormir mais.
Todos estes pequenos gestos que nos afastam da congruência entre a nossa pessoa e aquela desejamos ser causam um grande dano e podem acumular desconforto emocional e dor.
Contudo, a solução é bem simples (o que não deve ser confundido com fácil, pois nem sempre é fácil, quem disse que a vida é fácil?). A única coisa que temos a fazer para conseguir que nossa vida se encaixe com nossos valores é que as ações concordem com as intenções, que os costumes coincidam com os objetivos e que os minutos se ajustem à maneira em que vivemos esses dias.
Este é o segredo de ser feliz, todo o tempo, todo o maldito tempo. Consiste em conseguir objetivos, realizar propósitos e sentir-se como quiser se sentir. Se é possível fazer que seu exterior coincida com seu interior... tudo é possível.
Estou feliz... o céu hoje estava claro reluzindo um azul radiante.
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Comentários
Excelente texto: temática profunda e didaticamente bem abordada. Parabéns, Luisão.
Aqui, na Paulicéia incongruente, é constante o transtorno bipolar: de manhã frio e nublado. À tarde sol e color. À noite, vento e garoa. Preciso de mudar de cidade.... ;)
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