É egoísta dizer que o suicídio é egoísta?

LuisaoCS

É egoísta dizer que o suicídio é egoísta?

Logo após as notícias sobre o suicídio de Robin Williams por uma depressão severa, as homenagens e mensagens de admiração não pararam de ocorrer em meios e redes sociais, mas há vários que viram a oportunidade de criticar e desacreditar sua morte, como fazem com todas as figuras públicas que cometeram suicídio. No Facebook e blogs pessoais podemos ler comentários como "Suicidar é a coisa mais egoísta que uma pessoa pode fazer", "Fazer isso com a família é simplesmente egoísta", e dezenas de variações.

Aqui cabe um adendo para falar de como podem existir pessoas tão desgraçadas a ponto de intimidar a filha de Robin Williams no Twitter e Instagram, enviando mensagens a Zelda Williams culpando-a pelo suicídio do pai por enforcamento, bem como enviando fotos do comediante editadas mostrando hematomas no pescoço. A moça fechou suas contas e disse que vai passar um bom tempo longe da Internet, e o Twitter se comprometeu a revisar suas políticas de serviço, para evitar que ocorram casos similares no futuro. Mas como? Há trolls por todos os lados.


Quanto aos críticos ao "egoísmo", estão, se não são trolls ignorantes, ao menos muito desinformados. A tristeza estendida, ou depressão, é uma condição que se não sofremos, não deveríamos sequer tentar julgar -"Não critique o que não entende", já dizia Bob Dylan-. Hoje em dia banalizaram tanto a palavra depressão que deixamos de visualizar o que implica e até onde pode chegar.

Muita gente tende a desacreditar a depressão porque todos fomos miseráveis em algum momento da vida, mas a depressão é uma condição genuinamente debilitante, e ter um mau dia ou uma etapa miserável não o é. O problema é que os desequilíbrios mentais ou emocionais nunca recebem a mesma simpatia que as doenças físicas, como se os primeiros não fossem reais e fossem um tipo de invenção própria, uma dor de ouvido infantil para faltar a aula, uma debilidade ante a vida, que deve ser superada e pronto.

O caso de Robin Williams é um bom exemplo para ilustrar como a depressão não discrimina ninguém. Nem o dinheiro nem a fama nem o carisma salvam alguém de decidir terminar com sua vida. Talvez, seja todo o contrário. A banalidade só incrementa a sensação de que o mundo é absurdo e, sobretudo, doloroso. Nunca se está mais sozinho do que quando você se sente em uma ilha rodeado de gente estranha. Essa coisa de só querer dormir, ficar na penumbra, não conversar com ninguém, não pedir ajuda... enfim, desistir de tudo por achar que nada vale a pena e que ninguém gosta mais de você, que é a pior pessoa da face da terra e que tudo e todos estão contra você.

Ultimamente, a depressão é uma maneira de chamar um túnel existencial que torna tudo estranho e do qual é muito difícil sair se não tivermos à mão certas ferramentas. A lógica que tem uma pessoa saudável, não deprimida, nunca será a mesma lógica que levou o outro a tirar a própria vida. Os túneis são escuros e ali podem existir toda a sorte de monstros, mas não só monstros-quimeras, senão também monstros-verdades.

Um dos grandes problemas da depressão é que resulta em um estado difícil de ter boas ideias. É difícil dizer: vou meditar, comer alimentos saudáveis, dar uma passeada, escutar Pink Floyd, ir morar no mato, sorrir para uma criança... a pessoa não tem disposição nem para um valoroso e libertador VTNC. Dizer, então, que é "egoísta" cometer suicídio é emitir uma opinião completamente desinformada e, finalmente, banal. Quando se diz que é egoísta não se está referindo diretamente a nada, porque o suicídio varia tanto em seus crisóis quanto variam os infinitos túneis sob a superfície.

É egoísta dizer que o suicido é egoísta? Essa pergunta fica no ar. A verdade é que as opiniões sobre a tristeza, quando não estamos dentro dessa tristeza, são só opiniões. Falam só de quem as fala. O romantismo que popularmente relacionam à depressão e ao suicídio, pelo outro lado, cai nos mesmíssimos erros.


Notícias relacionadas:

 

Comentários

Não vejo como egoísmo, mas... uma pessoa que quer viver, mas já não vê em sua vida o que um dia idealizou.

Não foi egoísmo dele. Foi um grito mudo. Todos endeuzam tanto uma personalidade que esquecem que ali tem uma pessoa.

E continuo não gostando dele. Me viro com isso quando o encontrar no além-tumulo. Pré-supondo que exista um.

Deixe um comentário sobre o artigo











Comentários devem ser aprovados antes de serem publicados. Obrigado!