A deificação de Steve Jobs, o maior triunfo do marketing da Apple?
Não é a primeira vez que falamos sobre o campo de distorção da Apple e, agora, do exagerado lamento em massa ante a morte de Steve Jobs. Hoje o diário britânico The Guardian e o New York Times votam ao assunto e expandem esta interessante discussão, cuja profundidade é o culto ao materialismo e a exaltação do consumo, para além de que a perda de uma mente como a de Jobs seja uma tragédia para a humanidade ou não.
No The Guardian, Tanya Gold escreve um irônico artigo sobre como Jobs é agora a Princesa Diana dos Estados Unidos. Gold assinala que esta é a primeira vez que vemos as massas se comoverem pela morte de um CEO, um homem fundamentalmente dedicado a fazer dinheiro, e diz mordazmente que Steve Jobs é um bem sucedido aplicativo pós mórtem.
- "Será que as bênçãos de Jobs são uma nova expressão de materialismo puro? Não é suficiente que amemos nossos produtos quando as pessoas que os criaram morrem? É requerido que entremos em uma espécie de declive espiritual? Que significa chorar pelo inventor do iPhone? Para mim este é o maior triunfo de marketing da Apple e bem o oposto de uma experiência espiritual".
Que as pessoas amem seus iPhones é algo que o colunista do New York Times, Martin Lindtrom, comprovou, fazendo um estudo de ressonância magnética durante a exposição a estes produtos. No cérebro ao menos, uma pessoa responde ao som de seu iPhone "como responderia à proximidade de seu namorado ou namoradas". Amar alguém não parece ser algo fácil nem comum neste mundo, mas (por sorte?) amar um gadget parece ser algo muito acessível.
De maneira seguramente controversa, Mike Daisey está montando, desde antes da morte de Jobs (é bom ressaltar, para que não pensem que é oportunismo), uma obra teatral chamada The Agony and The Ecstasy of Steve Jobs, na qual questiona algumas facetas nem tão amáveis desta figura consagrada recentemente. Depois de viajar a China e visitar as fábricas onde fazem os iPhones e os iPads, onde assumiu o papel de um importante homem negócios para obter informação, Daisey relata:
- "O que me pareceu realmente perturbador foi o nível de desumanização implementado pelas corporações estadunidenses em colusão com seus fornecedores. E conclui que conquanto Jobs mudou o mundo em várias formas, escolheu não fazê-lo ao permitir que seus produtos fossem elaborados sob condições que vão na contramão da mais básica integridade humana".
Isto é algo que entre o estupor mediático não deve passar despercebido. Poderíamos louvar Jobs por sua contribuição ao desenvolvimento tecnológico da humanidade, mas consideramos que participar de maneira voluntária na exploração de milhares de pessoas -dando maior valor ao dinheiro que a vida humana- é algo que conquanto não diminui seus méritos, mas sim torna seriamente questionável sua idolatria, justamente como ocorre com o marketing, um engano e uma alienação. Talvez seja justiça (poética?) que em sua morte Jobs tenha se convertido em só um produto a mais dentro do sistema de consumo que ele tanto alimentou.
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Comentários
A frase final é excelente. E ai, novamente, ressalto. Não sou irônico, mas a vida faz bem seu papel.
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